A origem da devoção à Senhora dos Milagres na Serreta remonta aos finais do século XVII, quando o padre Isidro Fagundes Machado (1651–1701) se considerou vítima de injusta perseguição e se refugiou no local chamado Queimado, na região da atual Serreta. Ali, então um dos mais remotos trechos da ilha, ergueu, em cumprimento de um voto, uma pequena ermida, na qual colocou uma pequena imagem de Nossa Senhora com o Menino Jesus (a atual imagem de Nossa Senhora dos Milagres). Pedro de Merelim dá a seguinte versão da lenda que passou a rodear a origem do culto:
“Um padre velhinho, boa e santa alma, vendo-se em grande atribulação e desiludido do mundo, procurou um lugar ermo, onde, sem mais ninguém, se pudesse entregar à contemplação das verdades eternas. Seduziu-o a Serreta, junta da rocha, a uma boa légua da igreja. Sítio tranquilo e pitoresco, paisagens de arvoredos e fragas, bem próprio para escutar as vozes da natureza entoando um hino à criação – e aí se quedou. Estaríamos no século XVI. Levava consigo uma pequena imagem da Virgem, para a qual, por suas mãos, imperitas no ofício, edificou tosca capelinha, na Canada das Vinhas, Queimado, em reconhecimento do milagre que lhe fizera de o livrar do perigo. E o minúsculo templo serviu-lhe também de abrigo. As preclaras virtudes do venerando sacerdote tiveram o condão de, ao lugar da Serreta, levar subido número de pessoas. Morto o humilde e solitário clérigo, a singela ermidinha ficou abandonada, breve se arruinando. Outra se ergueu em local diferente. E esta segunda, igualmente carecida de assistência, além de sujeita às irreverências de alguns pseudo-romeiros, não terá oferecido por muito tempo as condições indispensáveis ao culto, pelo que o prelado mandou recolher a imagem da Senhora dos Milagres à paroquial de Doze Ribeiras.”
Neste novo domicílio, a fama da imagem continuou a atrair considerável devoção, passando a ser popularmente designada como Nossa Senhora dos Milagres em resultado dos milagres que eram atribuídos à sua intercessão. Além disso, “degradada esta ermida, a imagem de Nossa Senhora dos Milagres foi recolhida na Igreja de São Jorge das Doze Ribeiras (freguesia contígua) onde, em 1762, por Causa da aflição que a instabilidade militar do país fazia sentir, um grupo de “cavalheiros, militares, eclesiásticos, autoridades e algumas damas” fez voto de se tornarem seus escravos e promoverem-lhe festa anual se a ilha não sofresse qualquer investida”.
A evolução histórica reforça a devoção religiosa popular: “novo alento ganhou a devoção à Senhora dos Milagres com as investidas napoleónicas. Esta Irmandade dos Escravos de Nossa Senhora -entretanto desaparecida- também assumiu o compromisso, em 1797 de construir uma igreja no lugar próprio da Serreta. Mas foi por razões populacionais que se construiu a igreja “com donativos e as esmolas” afluídas “de todos os recantos terceirenses”, encontrando- se concluída em 1842, data em que a venerada imagem foi transferida para a comunidade. A 1 de Janeiro de 1862 o Curato da Serreta foi elevado à dignidade de Paróquia por decisão episcopal de D. Frei Estêvão”.